sexta-feira, junho 26, 2009

"Quais são as palavras que nunca foram ditas"... e precisamos urgentemente
dizê-las?

Há ultimamente algumas orações que não me saem da cabeça. Tantas são as necessidades, sonhos e desejos humanos, que há uma infinidade de palavras que carecemos para expressá-los a Deus. Três sentenças, no entanto, são sine qua non para a vida cristã, e encontramo-las em orações nos Evangelhos de Marcos e Lucas.

Evangelho de Marcos 10.51: “... Mestre, que eu veja!”.

Parece óbvio que um cego, tendo a oportunidade de fazê-lo, peça a Deus que o cure e, portanto, quem enxerga nada tem a ver com estas palavras, certo? Ocorre que Bartimeu levava vantagem sobre qualquer outro homem porque, diferente de todos, ele sabia que não enxergava. Isso mesmo! A diferença entre nós e Bartimeu está no fato de que ele estava cônscio de sua debilidade, enquanto nós levamos a vida sem nos dar conta que sofremos do mesmo mal.
Porque não enxergamos nossa principal debilidade, somos incapazes de ver o outro, o próximo, o amigo, o irmão como eles realmente são, com todas suas qualidades e também defeitos, a importância deles e o quanto deles somos dependentes. Somos incapazes muitas vezes de ver a riqueza dos dias e das manhãs, de ver as dádivas da saúde, do riso, do abraço, do afeto, do emprego, da comida, da água abundante, e, também, do sangue derramado e da salvação gratuitamente ofertada. Há entre nós vidas consumidas pela cegueira, que tendo tanto e tantos são capazes de viver em completa tristeza e agonia por algo que não possuem. Não foi à toa que Cristo nos disse que olhos bons põem todo o corpo em luz.

Evangelho de Lucas 18.13: “... Ó Deus, tem misericórdia de mim, pecador!”.

Quem julga enxergar precisa notar sua real condição. Somos todos iguais e igualmente carentes da graça e da misericórdia de Deus. Não há nada que possamos a ele ofertar que nos faça merecedores do seu favor e da sua atenção. Quão perniciosas são a presunção e a soberba, que não somente nos dizem que podemos e capazes somos de pagar a Deus, ou aos Céus, nossas dívidas e nossos pecados, como também de que somos capazes de tornarmo-nos livres de pecar, super-homens, santarrões, que a todos podem julgar e condenar, e também determinar como, de Deus, podem os homens se aproximar e com ele se relacionar. Se permitirmos que a presunção tome nossos corações, nos tornaremos como os de Laodicéia, e, do próprio Deus, ouviremos que somos desgraçados, miseráveis, pobres, cegos e nus. (Apocalipse 3.17-18)

Evangelho de Lucas 23.42: “Senhor, lembra-te de mim quando entrares no teu Reino”.
O famoso ladrão da cruz é o golpe mais duro nas infinitas doutrinas de sacramento. Ele não freqüentou os cultos de domingo, não tomou a santa ceia, não dizimou, não ofertou, não comeu a hóstia, não se batizou, não fez crisma, não se circuncidou, não guardou o sábado e tampouco o domingo, não recebeu extrema-unção, e ainda assim ouviu do Filho de Deus que, naquele mesmo dia, como ele estaria no paraíso. O grande absurdo do Evangelho de Cristo consiste no fato de que o senhor da salvação é ele, não nós. Muito antes, Deus já havia dito a Moisés (Êxodo 33.19) que teria misericórdia e se compadeceria de quem ele quisesse ter misericórdia e se compadecer. A salvação eterna, o caminho vivo e verdadeiro que leva a Deus, não pertence aos crentes, aos evangélicos, aos católicos, aos umbandistas, aos hindus, aos kardecistas, ou a qualquer outro, mas a Cristo, o filho de Deus, ao cordeiro de Deus, que tira o pecado de todos os homens, em todos os tempos e em todas as gerações, e que foi por Deus mesmo ofertado desde a fundação do mundo (Apocalipse 13.8). O que fez o ladrão da cruz, fazem também hoje muitos homens de todas as línguas, nações, ideologias e crenças quando, tocados pelo Espírito Santo, compreendem que têm diante de si o salvador e o reconhecem não como um guru, um espírito iluminado ou um grande sábio da humanidade, mas como Senhor e Rei, como o próprio Deus, que ofertou a si mesmo para que nele se cumprisse a justiça que determina que sem derramamento de sangue não há perdão de pecados. (Hebreus 9.22).

Entre tantas coisas que a Deus posso dizer, prefiro antes estas orações. Que nas minhas orações eu peça que não perca a habilidade de enxergar as pessoas que eu amo e de como sou rico por tê-las comigo. Que eu agradeça por tudo que eu tenho, mesmo que não seja tudo o que eu quero e julgue precisar. Que sejam orações nas quais eu consiga expressar um coração cheio de gratidão pelo perdão dos meus pecados, pela recondução ao Céu, pelo vivo sacrifício de Jesus e pelo privilégio de percebê-lo. Que eu peça a Deus que nunca deixe me sentir melhor que meus irmãos, mais santo que eles ou mais merecedor da graça de Deus que qualquer outro homem. Que, ao contrário, haja em mim um coração perdoador, capaz de perceber que também eu machuco e magôo, e que há em mim também todo o potencial de maldade e maledicência que há em qualquer homem e mulher e que, portanto, não sou melhor que ninguém e a ninguém posso julgar. Que possamos dizer palavras assim, que inspire quem perto de nós esteja a dizer: “Senhor, lembra de mim. Jesus, filho de David, tem misericórdia de mim, pecador”.


Abençoe-nos, Deus. Todos os dias.

domingo, junho 21, 2009

Nem todo o que me diz: irmão, irmão!

Dizia a antiga canção que "se o teu coração é igual ao meu, [...] meu irmão serás". A letra tinha uma proposta antipartidarista, mostrando que cristão é quem segue a Cristo e não a uma denominação.
Verdadeiros cristãos, no entanto, não precisam de canções para saberem que Igreja e Corpo não têm absolutamente nada a ver com denominações ou instituições religiosas, contudo, as canções continuam sendo necessárias, porquanto cristãos verdadeiros são poucos, e partidaristas uma incontável miríade, "tantos como a areia da praia".
"Irmão, você é benção na minha vida"; "Irmão, eu te amo"; "Paz do Senhor entre nós, irmão!". De verdade, alguém deixaria um irmão no ponto de ônibus, sob forte chuva, tendo espaço em seu confortável carro e indo para o mesmo bairro? Alguém deixaria seu irmão ficar sem luz, telefone, dinheiro de passagem ou até mesmo comida, tendo plenas condições de supri-lo? Alguém deixaria de visitar um irmão que estivesse doente? Alguém evitaria ir à casa de seu irmão por causa de desigualdade social? Quando encerra-se a reunião dominical, facilmente percebe-se que o termo “irmão” é utilizado apenas para designar um membro, um colega de séqüito.
O irmão Ronaldo veio do Espírito Santo para o Rio. Aqui conheceu Cristo, recuperou-se do alcoolismo e conseguiu um trabalho na igreja – ganhava o suficiente para comer e se vestir, e, em troca, trabalhava o dia inteiro. Quase todas as noites também, em tudo que fosse necessário.
Não era estúpido, havia perdido um bom emprego na Odebrecht e sua família somente por causa do vício, e, embora soubesse que não recuperaria seu status quo, pôde ainda iniciar-se em uma nova profissão. Abriu um pequeno negócio de informática, alugou uma modesta casa e trouxe de volta sua família. Estava feliz, havia recuperado sua dignidade.
Achou-se no direito de deixar o trabalho de mais de uma década na igreja – sem levar um vintém sequer – para dedicar-se integralmente ao seu negócio. Cometeu terrível engano.
Pouco tempo depois foi acometido de um derrame que paralisou parcialmente seus movimentos, o suficiente para comprometer suas habilidades, além de dificultar novos contatos pela mudança em sua aparência.
Achou que poderia contar com seus irmãos. Outro engano. Ronaldo não tinha mais a mesma utilidade para a igreja, ficou lento e complexo na fala. Não servia mais. Ganhou uns trocadinhos e muito desprezo.
Quatro anos depois, sob muitas pás de terra, sozinho num quarto de uma oficina que lhe fora cedido, sofreu a primeira parada cardíaca numa manhã. Outras duas se sucederam até que o único irmão que não o abandonou notasse que havia algo errado com Ronaldo, que já não tinha mais voz para pedir socorro. Era tarde demais quando à tarde deu entrada no hospital.
Ao menos restaria aos muitos outros irmãos e aos familiares a última despedida, a última mostra pública de consideração e estima. Não! Outro engano. Foi enterrado quase sozinho. Eu estava lá, mas lembro muito bem que lhe disse que não iria mais lhe emprestar os ouvidos para ouvi-lo blasfemar. Ainda bem que aquele de quem meu irmão blasfemava nunca, em momento algum, o deixou, antes prometeu que estaria com ele todos os dias, que não o deixaria nem o abandonaria. Se fizesse sua cama no mais profundo abismo, ali estaria. Se subisse o mais alto dos montes, ali também estaria.

Irmãos de verdade, cristãos de verdade, são pouquíssimos.

"Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus. Muitos me dirão naquele dia: Senhor, Senhor, não profetizamos nós em teu nome? e em teu nome não expulsamos demônios? e em teu nome não fizemos muitas maravilhas? E então lhes direi abertamente: Nunca vos conheci; apartai-vos de mim, vós que praticais a iniqüidade". Mateus 7.21-23